Caminha, a passo lento, o tempo
na aldeia da minha infância.
Debruça-se nos ombros dos antecipadamente reformados,
dos dispensados de serviço e come os ossos aos velhos de olhar parado, fixo no
horizonte sempre igual, sempre verde, ostensivamente verde e fresco!
Vive-se mais tempo, mas é um
tempo de temor, às vezes de remorsos, de males ruins, que o bem dos últimos
dias não eleva, não esquece, não perdoa. Vive-se e morre-se na aldeia da minha
infância, como na minha infância.
Morre-se devagar ao sabor dos
dias prenhes de fartura, engordados pela miséria e vestindo o traje habitual: esgares
de dor, laivos de riso, medo, incredulidade e, por vezes (muitas), esperança.
Aquela que ficou, depois de todos os males ocorrerem por ordem dos deuses,
ainda permanece, sendo o último reduto da humanidade.
É a ela que todos se agarram na
hora de partir e, na verdade, é vã, não dá respostas, nem conselhos, nem
procedimentos a tomar, nem a salvaguarda dos que ficam, nem a certeza dos
lugares do outro lado do Estige.
Aqui, hoje, existe a certeza de
um tempo lasso, frio e quente, húmido e seco que esvazia corpos que, ontem,
foram belos e perfeitos e os torna cadáveres ambulantes à espera da sua vez de
passagem e esperam ter o óbolo necessário para dar ao barqueiro.
Amanhã é só mais um passo, mais
um arquear do peito, um sorvo de ar que se esgota dia a dia no caudal virulento
da pressa das máquinas.